sábado, 31 de janeiro de 2009

A vaidade e o poder

"A vaidade é uma qualidade muito disseminada e talvez ninguém esteja livre dela. Nos círculos académicos e científicos é uma espécie de doença profissional. Mas precisamente no homem de ciência, por muito antipáticas que sejam as suas manifestações, a vaidade é relativamente inócua dado que, em geral, não estorva o trabalho científico. No político, que utiliza inevitavelmente como arma o desejo do poder, os seus resultados são muito diferentes. O instinto de poder, como se lhe costuma chamar, está assim, de facto, entre as suas qualidades normais. O pecado contra o Espírito Santo da sua profissão começa no momento em que este desejo de poder deixa de ser positivo, deixa de estar exclusivamente ao serviço da causa para se converter em pura embriaguez pessoal. Em última análise, só existem dois pecados mortais no terreno da política: a ausência de finalidades objectivas e a falta de responsabilidades. Esta coincide frequentemente, embora não sempre, com aquela. A vaidade, a necessidade de aparecer em primeiro plano sempre que possível, é o que mais leva o político a cometer um destes pecados ou os dois ao mesmo tempo. E tanto mais quanto é certo que o demagogo é obrigado a ter em conta o efeito; por isso se encontra sempre em perigo de se converter num comediante ou de não dar a devida atenção à responsabilidade que lhe incumbe pelas consequências dos seus actos, preocupando-se apenas com a impressão que provoca. A sua ausência de finalidade objectiva torna-o propenso a procurar a aparência brilhante do poder em vez do poder real; a sua falta de responsabilidade leva-o a gozar o poder pelo poder, sem tomar em conta a sua finalidade. Embora o poder seja o meio iniludível da política, ou mais exactamente, precisamente porque o é, e o desejo de poder seja uma das forças que a impulsionam, não há mais perniciosa deformação da força política que malbaratar o poder como um adventício ou comprazer-se vaidosamente no sentimento do poder, ou seja, em geral, toda a adoração do poder puro enquanto tal".
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in O político e o cientista, Max Weber