quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

cansaço, cansaço, cansaço...

Oh que cansaço destes infindáveis dias cinzentos, da chuva, do frio; cansaço do que se diz e do que se escreve (com belíssimas excepções). Só não me canso de Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), mesmo quando fala de cansaço. Neste dia de sol e céu azul que nos acordou hoje, ouçamos o Poeta:
O que há em mim é sobretudo cansaço -
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas -
Essas e o que falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Ìssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...
Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), 1934