sábado, 14 de janeiro de 2012

Nietzsche: "Ser independente..."

«Ser independente é uma questão que diz respeito a uma muito pequena minoria, é um privilégio dos fortes. Quem a tanto se abalançar, mas sem ser obrigado, prova desse modo que provavelmente não só é forte, mas também audacioso até à temeridade. Mete-se num labirinto, multiplica ao infinito os perigos inerentes à própria vida. E o menor desses perigos não está em que ninguém veja como e onde se perde, despedaçado na solidão por qualquer subterrâneo minotauro da consciência. Supondo que um tal homem pereça, o facto estará tão distante do entendimento dos homens que eles não o sentem, nem o compreendem. E ele já não pode regressar! Não pode sequer regressar à compaixão dos homens! (...) quero dizer, na medida em que somos os amigos inatos, jurados e ciumentos da solidão, da nossa própria solidão mais profunda de meio-dia e meia-noite: eis a espécie de homens que somos nós, espíritos livres! E talvez o sejais, também vós, que vireis, vós novos filósofos?»

Nota: publico estes excertos por compaixão, no sentido próprio da palavra, para com outro amigo da blogosfera, depois de ler um texto seu.

F. Nietzsche, Para Além do Bem e do Mal, Guimarães Editores, 1978, pp. 41 e 56

1 comentário:

Maria Josefa Paias disse...

Acrescento hoje e aqui um texto de Schopenhauer, que, de outro modo, vai mais directo à questão que esteve subjacente à minha mensagem: «Assim como ser insultado é uma vergonha, insultar é uma honra. Por exemplo, mesmo que a verdade, o direito e a razão estejam do lado do meu adversário, não deixo de insultá-lo; desse modo, todas as suas qualidades passam a ser desconsideradas, e o direito e a honra passam a estar do meu lado. Ele, pelo contrário, perdeu provisoriamente a sua honra - até conseguir restabelecê-la, não mediante direito e razão, mas por tiros e estocadas. Logo, a rudeza é uma qualidade que, no ponto de honra, substitui ou se sobrepõe sobre as outras. O mais rude tem sempre razão: para quê tantas palavras? Qualquer estupidez, insolência, maldade que alguém possa ter feito, uma rudeza retira-lhes essa característica e elas são de imediato legitimadas. Se, numa discussão ou conversa, outro indivíduo mostra conhecimento mais correcto do assunto, um amor mais austero à verdade, um juízo mais saudável, mais entendimento que nós, ou se em geral exibe méritos intelectuais que nos deixam na sombra, então podemos de imediato suprimir semelhantes superioridades e a nossa própria mesquinhez por elas revelada e sermos, por nosso turno, superiores, tornando-nos ofensivos e rudes.

Pois uma rudeza derrota todo o argumento e eclipsa qualquer espírito; isso se o oponente não tomar parte nela e replicar com outra maior ainda. Não o fazendo, chegamos à vantagem no nobre desafio; desse modo, permanecemos vitoriosos e com a honra do nosso lado. Verdade, conhecimento, entendimento, inteligência e espírito têm de ser desconsiderados e acabam por ser reprimidos pela divina rudeza. Por conseguinte: as «pessoas de honra», tão logo são confrontadas com uma opinião diferente da sua ou simplesmente com um entendimento mais arguto que pode contradizê-las, preparam-se imediatamente para montar no seu cavalo de batalha, e se, numa controvérsia, lhes faltar um contra-argumento, procurarão uma rudeza, que servirá para o mesmo fim e é mais fácil de encontrar. Em seguida, vão-se triunfantes. Nesse caso, já se vê o quão é justo dizer, em louvor do princípio da honra, que ele enobrece o tom em sociedade.» (in Aforismos para a Sabedoria de Vida)